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125 Anos do Jornal O Riomaiorense . Sessão Comemorativa (9)

                                                    

 

 

                                     

 

 

 

 

[Interrupção da assistência alertando o orador para o risco de caír da cadeira]

 

Adelino Gomes: Querem que fale assim, é? Ah! Senão caio... Isso era interessante. Era um acontecimento. Era uma notícia.

 

Conta-se aquela notícia, de um jornal local, normalmente nestas coisas diz-se que era num jornal local... Num jornal local, o estagiário foi mandado fazer o seu primeiro trabalho, e era um casamento de uma pessoa ilustre. E foi. O Chefe de Redacção disse: - olha, vais fazer o casamento do Dr. Laureano Santos. Vais ali, vê lá quem é que está, toma nota. Quero o ambiente, tudo isso, e tal... E daí a uma hora, ou duas horas, o homem chegou. o chefe da Redacção já estava a fechar o jornal.

 

- Então, notícia?

- Não há notícia!

- Então não há notícia porquê?

- Porque caiu o tecto e morreram todos!

Este não fez caminho no jornalismo não é...

 

Bom, aquilo que eu ia a dizer, olhando para as novas tecnologias, esse é o problema, como é que potenciamos. A questão da velocidade, por exemplo. Quando eu entrei no jornalismo, o nosso sonho era sermos os primeiros a dar a notícia. O bom jornalista era aquele que tinha um bom carnet de endereços, de telefones, o tipo que sabia: quem é que pode falar sobre isto? O Dr. não sei quantos... E depois era aquele que conseguia ser o primeiro. Nós chamamos a isso cachas. Somos os tipos que dão primeiro que os outros a informação.

 

Ora, agora de repente, parece que estamos a demonizar o ser o primeiro, porque na verdade é tudo tão rápido que já não há primeiro. Há um ruído de comunicação. Está tudo em primeiro lugar, com uma confusão enorme. Não há tempo de reflexão. O que o jornalismo ainda não conseguiu resolver foi: com esta velocidade extraordinária, como é que nós somos capazes de ao mesmo tempo descodificar a informação e reduzir aquilo, porque senão, a certa altura já não há jornalismo.

 

Olhando para aqui, um tipo que chegar ali e vir tudo isto diz assim: estão aqui muitas pessoas e está um fulano ali a fazer gestos há não sei quanto tempo. A falar umas coisas sobre jornalismo. O tipo não percebeu nada do que se estava aqui a passar. Portanto, isto não é informação. Tem dados... ele até é capaz de dizer que são cinquenta pessoas, quatro estão sentados, parece que esses é que têm direito a falar. Os outros estão calados, só uma pessoa é que ainda falou, e tal... Isto não acrescenta nada à informação.

 

E muitas vezes nós, quando falamos das redes sociais... é uma confusão. É uma confusão, porque nós ainda não fomos capazes de ver disso tudo, desse bru-a-a.

 

Um dia li num livro sobre jornalismo um tipo a falar disso: o jornalismo é a capacidade... fazer jornalismo é a capacidade de, do ruído do Bazar Turco retirar o negócio interessante. O negócio significativo. Aquilo que é importante. Porque senão é tudo um Bazar. São milhares de pessoas a fazerem negócios. Andam para aqui e para acolá, quer dizer, se um tipo fica por aí, fica na superfície das coisas, fica na espuma das coisas. É preciso ir fundo, é preciso perceber.

 

E depois ainda por cima há a ilusão de informação. Como há barulho, como há milhões de tweets, como as redes sociais nos dão tema de informação. Como ainda por cima a internet rouba, tira aos jornais as notícias e ainda por cima dá as notícias com três linhas... escusamos de estar a ler aquilo tudo. Nós temos a ilusão de que estamos informados.

 

Este é um problema global. As pessoas começaram a comprar menos jornais, a ver menos televisão, a ouvir menos rádio, e ao fazerem isso os anunciantes deixaram de pôr lá os anúncios, e põem na internet. Há um conjunto de problemas que têm de ser resolvidos. E são vários. E alguns são do campo jornalístico, da própria profissão de jornalista, e outros são dos meios, das tecnologias, outros de ordem também jurídica, etc.

 

O que me parece é que nós estamos no olho do furacão, estamos no meio das mudanças, estamos no meio da transição. Não temos ainda visão suficiente para perceber os melhores caminhos. E, portanto, do meu ponto de vista, neste momento há um problema existencial. Quase como o ser ou não ser, eis a questão. Aqui é interessar ou não interessar, eis a questão. Interessar ou não interessar e ser rigoroso ou não ser rigoroso, eis a questão. Porque as pessoas não precisam dos jornais. As pessoas não precisam do telejornal, as pessoas não precisam da rádio, porque têm o seu telemóvel, têm lá tudo, têm lá praticamente tudo.

 

Mas é necessário ou não é necessário o jornalismo? Se partimos do princípio que é necessário (e nós os profissionais tendemos a pensar que é até mau para a democracia), mas que também é mau para a sociedade em geral, seja qual for a sua organização, não saber o que se passa, com rigor, então é necessário defender o jornalismo.

 

As pessoas deixaram de se interessar pelas notícias, pelos conteúdos jornalísticos. Como é que vamos, outra vez, voltar a interessar as pessoas? Tem de ser explicar-lhes que elas têm vantagem em...

 

O jornalismo sem credibilidade não vale a pena. E, portanto, o problema é esse. É como é que eu posso ser interessante, por um lado, interessar as pessoas, e por outro dar a garantia de que o tal contrato social implícito é correspondido da minha parte.

(Continua na página seguinte)

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Perspectiva da assistência durante a Sessão Comemorativa dos 125 Anos do Jornal O Riomaiorense. © Fotografia gentilmente cedida pelo jornal Região de Rio Maior.

"(...) fazer jornalismo é a capacidade de, do ruído do Bazar Turco retirar o negócio interessante. O negócio significativo. Aquilo que é importante. Porque senão é tudo um Bazar."   Adelino Gomes

 

"(...) estamos no olho do furacão, estamos no meio das mudanças, estamos no meio da transição. Não temos ainda visão suficiente para perceber os melhores caminhos. E, portanto, do meu ponto de vista, neste momento há um problema existencial."

Adelino Gomes

 

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