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Família Marques, uma família de Moleiros

                                                    

 

 

                                         Por Maria Alzira Almeida

                                              Associada da EICEL1920

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Imaginemos Rio Maior no século XIX, com os sítios da «Ribeira Acima» e da «Ribeira Abaixo». Designações encontradas frequentemente nos registos paroquiais e também nos dicionários da época (1). Talvez que a separação fosse a ponte, já que o Moinho do Jogadouro, o Moinho da Cova, o Moinho do Chão e o Moinho do Norte ficavam em «Ribeira Acima», enquanto o Moinho da Areia “do lugar das Bastidas" (2), o Moinho da Barroca, o Moinho da Carapua, o Moinho da Estrela e o Moinho do Piloto, entre outros, ficavam em «Ribeira Abaixo».

Imaginemos todos estes moinhos a laborar, existindo entre os moleiros fortes laços de união, evitando a concorrência. Os documentos levam-nos a pensar que nos moinhos da «Ribeira Acima» dominava a família Marques, nos da «Ribeira Abaixo», a família Pereira.

Quem eram os Marques? O primeiro a chegar a Rio Maior foi Joaquim Marques (1773-1833), que nasceu em Alvorninha. Tinha ligações a Rio Maior, pois sua avó materna era dos Casais da Serra, da freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Rio Maior. Joaquim casou duas vezes em Rio Maior, ficando a residir na Porta de Teira, à Fonte da Bica. São os filhos do seu segundo casamento, assim como alguns netos, que se dedicam à moagem.

 

Seu filho, Vicente Marques também casou duas vezes. A sua primeira esposa, Maria Bibiana, morre em 1851 no moinho do Jogadouro, onde o casal era morador (3). Em 1853 volta a casar, agora com Elisa Rosa, da Fonte da Bica, continuando o noivo a residir no mesmo moinho. Entre 1851 e 1878, é sempre referido como moleiro, morador no Moinho do Jogadouro ou em «Ribeira Acima».  Seus filhos Teresa de Jesus (1849), João Vicente Marques (1853), António Vicente Marques (1858) e Maria da Conceição Marques (1861) vão seguir a profissão do pai.

- Teresa de Jesus casou com José Dionísio Pereira, filho de moleiros da «Ribeira Abaixo». Em 1878 eram moleiros, moradores no moinho do Canto. José morre aos 36 anos no Moinho da Cova, em «Ribeira Acima». O que demonstra que os moleiros transitavam entre os moinhos, a que tinham direito por arrendamento. Teresa de Jesus volta a casar aparecendo como moleira no assento do segundo casamento.

 

- João Vicente Marques foi moleiro no Moinho do Canto. Aí nasceram os seus filhos José (1893), Genoveva (1895), António (1897) e Virgínia (1898).

 

- António Vicente Marques, casa aos 33 anos, sendo dado como moleiro, morador na «Ribeira Acima».

 

- Maria da Conceição Marques casa em 1886 com Joaquim Carvalho Goucha (1861-1940), da Vivenda. O seu sogro, José Carvalho Goucha, arrendara o Moinho do Chão à dona da Quinta do Jogadouro entre 1860 e 1870. Da escritura então lavrada consta que este moinho tinha três engenhos, casa e terras anexas. O foro anual, a pagar “pela feira grande da vila”, no mês de setembro, era de 33 alqueires de trigo, 33 alqueires de milho e 12 galinhas, o que representava um foro bem superior a qualquer arrendamento de terras (4). De relevar que, como já acontecera com Teresa de Jesus, filhas de moleiro casavam com moleiros. Em 1900, 1902 e 1904 nascem os filhos Virgínia, Aurora e Madail, no Moinho do Norte da «Ribeira Acima» ou moinho do Norte ao Jogadouro.  Em 1911, no assento de casamento da filha Teresa, o pai é carpinteiro e a mãe doméstica, moradores no moinho do Norte. Também o filho Joaquim, padrinho de casamento da irmã aparece como carpinteiro, morador no Moinho do Norte, tendo, anteriormente, sido dado como moleiro. Parece que a implantação da República veio afetar o estatuto dos moleiros.

 

Maria da Anunciação Marques (1818), segunda filha do segundo casamento de Joaquim Marques, casa em segundas núpcias com António Pereira do Casal (1822-1909) que também é dado como António Pereira Moleiro. Assim acontece numa escritura de 1870, em que a senhoria, D. Maria Isidra de Azevedo Vasconcelos, os reconhece como foreiros. Em 1872 e 1883 são padrinhos de batismo de crianças da família, sendo referidos como moleiros.  Das quatro filhas deste casamento (seriam estas as “Marquesas” da Fonte da Bica?) Jesuína da Conceição Pereira (1855-1936) e Maria Isidra da Conceição (1857) aparecem como padeiras nos assentos de casamento. A primeira casa, em 1880, com José de Deus Gonçalves, ele sim, moleiro, morador na “Assenta” e conhecido popularmente por «José da Senta». O Riomaiorense de 5 de junho de 1915, dá notícia do seu suicídio, indicando-o como “industrial de padaria”. Maria Isidra casou com João Frazão Júnior (1851-1919), vulgo «João Caixeiro», e dedicaram-se ao comércio, com estabelecimento no rés do chão do nº 5 da Av. 5 de outubro. Entre a multiplicidade de produtos que comerciavam contava-se o pão.

Uma outra filha de Joaquim Marques, Maria dos Santos, casa em 1849 com Joaquim da Silva, da Freiria, ficando os noivos a morar no Moinho do Chão.

Da família Pereira, sabe-se que em 1798, Melchior Pereira de Figueiredo e sua mulher Maria Fróis, moradores no Moinho da Areia em «Ribeira Abaixo», tomam o mesmo moinho de emprazamento, com todas as suas pertenças. No século XIX, seus filhos vão surgindo a ocupar os moinhos ora em «Ribeira Abaixo», ora em «Ribeira Acima», com destaque para o sítio das Bastidas. Alguns dados, a título de curiosidade, dizem-nos que em 1850, nasceu Conceição no Moinho da Areia, filha de Dionísio Pereira Belchior e neta paterna de Melchior Pereira. Uma outra filha de Dionísio, Maria das Dores, casa com Luís Henriques Pinto, nascido nas Bastidas, sendo os seus pais de Alvorninha. E assim temos outra família, a família Pinto, também ela dedicada à profissão de moleiro. Em 1876, Dionísio Pereira Belchior, morando no Matão, compra um moinho movido pela força do vento no sítio do Cabeço, perto da estrada real, próximo do Alto da Serra (5). Do que se pode concluir que, para além dos casamentos entre os filhos dos moleiros, estes pretendiam dominar o negócio não se limitando aos moinhos movidos a água, mas adquirindo também moinhos de vento.

 

(continua na página seguinte)

 

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Figura 1 - Família Marques, 1965.

Da esquerda para a direita: Amílcar Almeida Marques,  (1921-2017), Dotília Gualdino Almeida (1894-1983), João Ferreira Marques (1893-1972), Maria Virgínia Marques (1918-1972). Fotografia gentilmente cedida pela Sr.a D.a Irene Marques.

(1)

Ver «Rio Maior» in Américo Costa, Diccionario Chorographico de Portugal Continental e Insular, Porto, Livraria Civilização, 1948, pp. 339-343.

(2)

Cf. Paroquiais de Rio Maior, Lv.º O31, 1900, assento 21.

(3)

Todos os dados genealógicos da Família Marques foram obtidos nos Livros Paroquiais de Rio Maior, sendo fastidioso enumerar os livros, páginas e assento de todos eles.

(4)

Livro de Notas n.º 59 do tabelião António Manuel Pinto, fls. 2 a 3.

"Imaginemos todos estes moinhos a laborar, existindo entre os moleiros fortes laços de união, evitando a concorrência. Os documentos levam-nos a pensar que nos moinhos de Ribeira Acima dominava a família Marques, nos da Ribeira Abaixo, a família Pereira.

 

(5)

Livro de Notas n.º 76 do tabelião António Manuel Pinto, fls. 37 a 38.

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