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Memórias da Comunidade Mineira de Rio Maior, 1916-1969 (1)

                                                    

 

 

                                        Por Nuno Alexandre Dias Rocha

                                                Presidente da Direcção da EICEL1920

 

 

 

 

Palavras chave: Comunidade Mineira, Memória Colectiva, Minas do Espadanal.

Keywords: Mining Community, Collective Memory, Espadanal Mines.

 

 

Resumo:

 

As minas de lignite do Espadanal (Rio Maior), exploradas desde 1916, foram chamadas pelo governo de Salazar a cumprir uma função de reserva estratégica de combustível durante a Segunda Guerra Mundial.  No pós-guerra, precavendo a eventualidade de um novo conflito internacional, o Estado apoiou financeiramente o aproveitamento industrial da mina através da instalação de uma fábrica de briquetes, tornando-se accionista maioritário da empresa concessionária.  

O presente artigo expõe de forma sintética as condições laborais, de assistência social e de alojamento da comunidade mineira, no quadro de uma importante fixação de mão-de-obra, descrevendo, em simultâneo, a importância desta nova comunidade na transformação sociocultural da vila de Rio Maior.

Apresenta-se ainda uma leitura inédita da crise social desencadeada pela descapitalização da empresa concessionária na década de sessenta, e do início de um processo malogrado de reconversão da exploração mineira que resultou no seu encerramento em 1969.

 

 

Abstract:

 

The Espadanal lignite mines (Rio Maior), explored since 1916, were requested by the Government of Salazar to serve as a strategic fuel reserve during World War II. In the post war period, preventing the possibility of a new large scale international conflict, the Portuguese State gave financial support to the industrial development of the mine, through the installation of a briquette factory, becoming the main shareholder of the mining company.

This article presents, in summarized form, the working conditions, the social assistance and housing solutions provided to the mining community in the context of a significant migration of labour force, describing the importance of this new community in the socio-cultural transformation of the Rio Maior town.

A previously unavailable analysis of the social crisis triggered by the undercapitalization of the mining company in the sixties is presented, as well as a reading of the early steps of an unsuccessful restructuring process of the mine, which resulted in its shutdown in 1969.

 

 

 

1. DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL

 

 

A exploração de carvões no concelho de Rio Maior é indissociável de dois períodos de crise política e económica internacional: as duas Grandes Guerras do século XX. A personagem fundamental no lançamento da lavra mineira local foi António Custódio dos Santos (1885-1972) (figura 1), antigo Presidente da Câmara Municipal (1910-1911) e Tesoureiro da Fazenda Pública (1912-1928).

Em 1915, com a subida do preço dos combustíveis provocada pelo início da I Guerra Mundial, Custódio dos Santos constituiu uma primeira sociedade para pesquisas de carvão nas imediações da vila de Rio Maior. A 25 de Agosto desse ano registou, na Câmara Municipal, a primeira mina de lignite, a Mina da Quinta da Várzea, seguindo-se a 21 de Julho de 1916 o registo da Mina do Espadanal.

O reconhecimento dos direitos de Custódio dos Santos como descobridor legal das duas minas atrasar-se-ia, no entanto, devido à contestação da sua legitimidade pela Empresa das Minas de Carvão de S. Pedro da Cova. Os alvarás de concessão das minas da Quinta da Várzea e do Espadanal foram emitidos respectivamente a 13 e 27 de Fevereiro de 1918.

A necessidade de aumento de capitais para infra-estruturação da mina levou Custódio dos Santos e associados à criação, em 1920, de uma nova organização industrial que marcou de forma indelével o progresso económico e social da região durante meio século: a Empresa Industrial Carbonífera e Electrotécnica Limitada (EICEL), com um capital social inicial de 450.000$00, correspondente à soma das quotas de um grupo de trinta e quatro sócios (1).

A obtenção de espaço vital para a actividade mineira surgiu apenas na década de 20, com a demarcação dos coutos mineiros da Quinta da Várzea e do Espadanal.  Das áreas concessionadas apenas no Couto Mineiro do Espadanal se estabeleceu uma lavra activa. O período compreendido entre a década de 20 e o ano de 1939 foi caracterizado, no entanto, por uma exploração residual devida à dificuldade de colocação das lignites no mercado de combustíveis.

 

 

Nota:

O presente artigo foi apresentado no dia 12 de Setembro de 2014, no painel "Memórias Económicas e Sociais" das Jornadas Internacionais "Memórias do Carvão", realizadas nos concelhos da Batalha e Porto de Mós, e foi, posteriormente, publicado nas respectivas actas com uma ortografia e selecção de fotografias alheias ao autor.

O Riomaiorense publica nesta edição a versão original do artigo "Memórias da Comunidade Mineira de Rio Maior, 1916-1969".

Figura 1 - António Custódio dos Santos (1885-1972). Fotografia datada de 1907.  

© Colecção Teresa Santos do Carmo, Arquivo EICEL1920.

(1)

O capital social inicial da EICEL, no valor de 450.000$00, foi subscrito pelos seguintes sócios: Manuel Martins da Rocha, 55.000$00; Caetano da Silva Campos, José Silvestre da Silva Campos e António Custódio dos Santos, cada um, 45.000$00; Francisco Xavier Esteves, 37.750$00; D. Vasco Bramão, 31.250$00; Domingos Gonçalves Sá Júnior, 15.000$00; Banco Comercial do Porto, Banco Aliança, D. Emília da Silva Ferreira Gomes Samagaio e Eduardo José Barreto, cada um, 10.000$00; Francisco Cândido Moreira da Silva, António da Silva Marinho, José Esteves Fraga, Eduardo de Andrade Vilares, Albino Magalhães Mendonça, Augusto da Silva Cunha, José Gromwell Camossa Pinto, Silvino Pinheiro Magalhães, Manuel António Faria Vilaça, Alfredo Neves da Silva Marinho, Joaquim França Oliveira Pacheco, firma C. Dupin & C.ª, António Martins Viana, D. Alberto Bramão, Rui José de Albuquerque de Orey, Padre Manuel Martins Sá Pereira, D. Teresa Fernandes Rocha, António Ferreira Antunes e António Guilherme de Oliveira, cada um, 5.000$00, Manuel Fortunato de Oliveira Mota e Artur Manuel Rato, cada um, 2.000$00; António Nicolau Brito Rato e Vítor Augusto Dourado, cada um, 1.000$00.

Escritura de Constituição da EICEL. Publicada no Diário do Governo n.º 217, 3.ª série, de 13 de Outubro de 1920.

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