(Opinião) Boa Fé - Um Conceito em (Des) Uso
Por Manuela Fialho
Secretária da Mesa da Assembleia-Geral da EICEL1920
O estabelecimento de padrões éticos de conduta entre partes que negoceiam entre si não é uma ideia nova no ordenamento jurídico nacional. E nem sequer é uma ideia. Foi, desde tempos imemoriais, arvorado a princípio geral de direito, integrando a categoria de princípios fundamentais constituintes do próprio Direito.
Esta característica fundamenta a necessidade da sua observância quer nas relações entre a administração pública e os cidadãos, quer nas relações de direito privado que estes estabeleçam entre si, tendo, mesmo, naquela dimensão, dignidade constitucional.
Ao mesmo tempo que se define como objetivo para a administração pública a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, estabelece-se, por via da Constituição da República Portuguesa, a necessidade de os órgãos e agentes da administração atuarem, no exercício das suas funções, com respeito, entre outros, pelo princípio da boa-fé. Com o que se define um padrão de atuação ético-racional.
E, nas relações de natureza privada, o mesmo princípio é a base de todos os negócios, quer durante a pré negociação, quer durante a vigência e execução dos contratos.
O mesmo princípio impõe que, no recurso aos tribunais, as pessoas litiguem de boa-fé, havendo lugar a pesadas sanções para aqueles que infrinjam tal regra.
Agir de boa-fé implica um comportamento honesto, correto, probo. No fundo, uma intenção pura, sem meias verdades ou sem intenção de enganar ou de esconder factos importantes.
Uma atuação conforme a este princípio torna previsível e expectável o comportamento subsequente, implica uma ideia de não contraditoriedade. Cria, em suma, segurança aos intervenientes numa qualquer relação de cariz público ou privado, permitindo pôr em marcha as condições necessárias à execução dos acordos alcançados.
É, assim, expectável, entre pessoas de bem, que a palavra dada assuma força vinculativa.
Ora, sendo este um princípio antigo, não é demais trazê-lo à colação em tempos modernos. Tempos em que os interesses ou projetos individuais dão especial relevo aos fins, sem que se valorizem os meios para os atingir. A existência de padrões comportamentais em que nos revejamos é essencial a uma sã vida em sociedade e daí que a busca de consensos através de processo negociais, muitas vezes difíceis, não prescinda nem do bom senso dos intervenientes, nem dos valores inerentes à pessoa humana.
Falando sobre a arte da manipulação inerente aos políticos em geral, José Miguel Júdice dizia, na TVI24, no programa 21ª Hora de 8/11/2016, que “as pessoas não são todas políticas. Sabem que, quando se diz uma coisa, é para cumprir”. Assim seja!
Manuela Fialho
Figura 1 - Cumprimento entre o Dr. Francisco Calisto e o Eng. Luís Falcão Mena, capitães das equipas formadas por associados da Assembleia Riomaiorense e técnicos superiores da EICEL, numa partida de futebol disputada no dia 22 de Março de 1945.
© Colecção Luís Falcão Mena, Arquivo EICEL1920
"Agir de boa-fé implica um comportamento honesto, correto, probo. No fundo, uma intenção pura, sem meias verdades ou sem intenção de enganar ou de esconder factos importantes."