Sempre de cor amarela, encontra-se no Enxerto
Por Maria Júlia Faria e Silva Antunes Figueiredo
Membro do Conselho Consultivo da EICEL1920
1 - Não é preciso fechar os olhos por um momento para voltar ao passado, ao tempo de criança, para lembrar como eram as coisas, o sítio, o prédio.
Já era amarelo, tinha a forma triangular como se fora um ferro de engomar ali posto, era um enxerto a cobrir o espaço aberto de onde irradiariam ruas e casas. Estou no Enxerto onde a água do Galinha corria em liberdade, lavava e dava de beber aos que ali acorriam. Era abundante e fresca; hoje, resta a torneira que lhe trancou a abundância, o desperdício.
Nos tempos de hoje faz parte do Centro Histórico de Rio Maior, de facto, tem história e estórias para contar…
Era zona privilegiada para dar casa aos técnicos da mina de carvão; por ali, até à Moagem, moravam, além dos nascidos, o engenheiro, o enfermeiro e o chefe das oficinas, o secretário e funcionários administrativos, a visitadora…
O movimento era grande. Porém, os meus olhos recordam o fascínio daquele prédio amarelo, ali bem no meio onde acorriam as famílias dos mineiros. Iam à visitadora, talvez, confiar-lhe um problema, uma dificuldade dos seus.
Não sabia, mas já calculava o porquê da sua peregrinação àquela casa, ouvia contar…
Aquele prédio de 1913, sabia muito da terra e das pessoas.
2 - Quando se gosta de um sítio ou de uma coisa, volta-se aí e deseja saber-se deles.
Propriedade da família Coimbrão manteve a arquitectura até aos nossos dias. Prédio bonito tinha, como concorrentes, por iguais na traça, outros dois ali na Praça do Comércio.
Nunca sofreu alterações e nunca cansou por sempre igual; as suas paredes ouviram as falas da família do cabo Mário, Guarda Republicano, de Ismael Sampaio, Chefe da Tesouraria e outras, enquanto o r/c servia para armazém da mercearia Irra para, em 1986, dando crédito à fascinação da criança, aparecer a Corfig, uma referência para a zona como Centro de Línguas e sede da representação portuguesa de uma associação de empresas europeia.
No então armazém, sala ampla depois, fizeram-se exames do British Council, dramatizações para prática do Inglês, exposições de pintura de artistas riomaiorenses e da fotografia de Luciano Rodrigues.
3 - O prédio amarelo, um dos mais bonitos da cidade e do Centro Histórico de Rio Maior, passou de mãos para a sociedade Correia & Figueiredo lda em 1994 e, em 2004, para a autora deste texto, a criança que se enamorara dele.
Completou neste século os 100 anos, não se deixou arrastar pelo peso da idade, é digno dos que o construíram, dos que ali viveram e exemplo de que a conservação do edificado pode acompanhar as alterações funcionais dos tempos.
Maria Júlia Figueiredo
(escreve de acordo com a antiga ortografia)