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O Riomaiorense e a Primeira Guerra Mundial

Naulila . Um episódio da 1.a Grande Guerra

                                                    

 

 

                                         Por Maria Alzira Almeida

                                              Associada da EICEL1920

 

 

Foi no século XIX que os países industrializados europeus começaram a demonstrar o seu interesse por África, dando início ao que é habitual designar como a «corrida a África».

 

Um dos mais conhecidos momentos para decidir sobre a partilha e ocupação de África foi a Conferência Internacional de Berlim (1884-1885), da iniciativa de Bismark, para a qual Portugal foi convidado. A decisão mais importante que saiu desta Conferência foi a legitimação do direito de ocupação efetiva, em detrimento dos direitos históricos.

​Era a pior decisão possível para Portugal, pois os territórios que proclamava como seus por direito histórico, não estavam efetivamente ocupados. Havia um número diminuto de brancos, e mesmo esses radicados no litoral. A Coroa preocupava-se, quase exclusivamente, em proteger as feitorias costeiras e nunca incentivou uma migração para as colónias. Por seu lado os emigrantes portugueses preferiam o Brasil ou os Estados Unidos, com garantia de emprego, à terra de degredados que eram as colónias portuguesas de África.

 

Esta situação, difícil de resolver a breve prazo, leva às expedições de Silva Porto, Capelo & Ivens e Serpa Pinto. Não estando ocupadas, era importante fazer um reconhecimento científico das terras que o país defendia como suas. Reconhecimento que leva à elaboração do «mapa cor de rosa», baseado na ambição portuguesa de unir os territórios de Angola a Moçambique. Ambição que vai colidir com os interesses ingleses de ocupação, unindo o Cabo ao Cairo. Estamos em 1890, ano do Ultimato inglês, negociado pela coroa portuguesa a desfavor das suas ambições, o que tanto exaltou os ânimos da população portuguesa. Mas entre Portugal e Inglaterra ficam definidas as fronteiras das possessões africanas de ambos os países. O que não é aceite pelos outros países europeus, tendo a Alemanha ocupado o norte de Moçambique a partir de 1894.

 

Há mesmo um tratado anglo-alemão (1898), prevendo a partilha dos territórios de Angola, Moçambique e Timor entre os países signatários.

 

Foi a eclosão da guerra anglo-bóer que trouxe benefícios para Portugal. Sendo neutral, permitia o acesso dos portos portugueses às tropas inglesas e cimentou a velha aliança anglo-lusa.

 

Entretanto, em Portugal dá-se a implantação da República, o que foi mal-aceite pela Europa monárquica. O novo regime precisava de demonstrar a sua capacidade governativa. Não podia deixar de responder às ameaças alemãs em África, contra os nossos territórios.

 

É hoje habitual ouvir dizer que Portugal não devia ter entrado na 1.ª Guerra. Mas face à situação, como podia deixar de o fazer? Tendo a guerra começado a 28 de julho de 1914, o Parlamento português na sua Sessão de 07 de agosto de 1914 decide “cumprir todos os deveres de aliança” (1) e apoiar a Inglaterra ignorando a neutralidade assumida durante a guerra anglo-bóer.

 

Quando, a 9 de março de 1916, a Alemanha declara guerra a Portugal, baseia-se na não-neutralidade portuguesa porque proibiu o abastecimento de carvão aos navios alemães; consentiu a permanência de navios ingleses nos portos portugueses; consentiu na utilização da Madeira como base naval; permitiu a passagem de tropas inglesas por Moçambique; entregou o caça torpedeiros Lis à Inglaterra; e finalmente, tinha atraído os alemães a Naulila (Outubro de 1914) para os prender e assassinar, demonstrando ser Portugal um país “violador do direito" (2).

O que aconteceu em meados de outubro de 1914 e que ficou conhecido como «incidente de Naulila» foi que um grupo de alemães acampava em território português. Um alferes de cavalaria português recebeu ordens para reconhecer as pessoas acampadas. O alferes foi informado pelos alemães que perseguiam um desertor e aguardavam autorização do administrador português para seguirem caminho. O alferes, de nome Sereno, elucidou-os a quem deviam pedir autorização e pediu-lhes que o acompanhassem para tratar do assunto. E na manhã seguinte todos se puseram a caminho de Naulila, onde chegaram e os alemães foram convidados a almoçar. Tendo os alemães montado, um deles empunhando uma carabina, ficaram os portugueses desconfiados e dispararam. Foram mortos três alemães e o intérprete ficou prisioneiro.

Doze dias depois, um capitão de cavalaria comandando trinta alemães, armados de metralhadoras, acompanhados pela sua polícia indígena e por naturais de Angola, atacam de surpresa o posto militar português matando, saqueando e incendiando as fortalezas de Naulila e Cuangar. A 18 de Dezembro do mesmo ano, dá-se mais um violento ataque em Naulila. De salientar que todas as ações decorreram em território português. Se algum país tinha violado direitos, esse país era a Alemanha.

 

Também em Moçambique os direitos foram violados. Logo a 24 de agosto de 1914, 19 dias depois de a Inglaterra ter entrado na guerra, foi atacado o posto de Maziua, no norte da província, na fronteira com a colónia alemã, sendo saqueado e incendiado.

(continua na página seguinte)

Figura 1 - O capitão de mar e guerra Sr. Nunes da Silva, comandante do corpo de marinheiros, e o Sr. Coriolano da Costa, comandante do batalhão expedicionário, passando revista às praças. © Joshua Benoliel. Reprodução de Ilustração Portuguesa, n.o 456, de 16 de Novembro de 1914.

Figura 2 - O navio Beira, que transporta a expedição. © Joshua Benoliel. Reprodução de Ilustração Portuguesa, n.o 456, de 16 de Novembro de 1914.

Figura 3 - Chegada a Moçâmedes - O governador sr. Norton de Matos e o Tenente-Coronel Alves Roçadas à chegada na ponte de desembarque. © Reprodução de Ilustração Portuguesa, n.o 459, de 7 de Dezembro de 1914.

(1)

GARÇÃO, F. Mayer - "Relatório Oficial Justificativo da Intervenção de Portugal na Guerra", in História Contemporânea de Portugal / Primeira República, direção de João Medina, Multilar, s. d., pág. 60.

(2)

Idem, ibidem, pág. 66.

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