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O Centro Histórico de Rio Maior. Proposta de salvaguarda (6)

 

 

                         

 

 

 

2 – CICLOS DE DESTRUIÇÃO E CONSERVAÇÃO DO NÚCLEO URBANO ANTIGO DE RIO MAIOR

 

 

2.1 – (1974-1985) Demolição sistemática, descaracterização e ruptura de escala

A Câmara Municipal de Rio Maior foi, desde tempos antigos, o principal promotor da descaracterização do núcleo urbano antigo. Já no século XIX um presidente da Câmara foi alcunhado de “o bota-abaixo” pela sua insistência na demolição de varandas na zona antiga.

 

A decadência da imagem urbana da zona antiga de Rio Maior inicia-se, contudo, mais tarde, ainda durante o Estado Novo, com a substituição das velhas calçadas por pavimentos betuminosos e a construção dos primeiros edifícios descontextualizados, na Rua Serpa Pinto n.o 24 e na Rua do Calvário.

A coerência do núcleo urbano histórico é comprometida entre 1974 e 1985. Dez anos sob a égide dos primeiros executivos autárquicos democráticos, marcados pela expectativa de um possível aumento significativo da população devido à planeada construção de uma central termoeléctrica alimentada pela Mina do Espadanal.

 

A aspiração legítima ao desenvolvimento, aliada à escassa preparação técnica dos novos autarcas e a um plano de urbanização da autoria do arquitecto municipal, Carlos Garcia, que introduziu fortes rupturas de escala no tecido urbano, gerou um período de caótica especulação imobiliária. São construídos diversos edifícios descontextualizados e de arquitectura medíocre em zonas consolidadas, contrariando as boas práticas reconhecidas no plano internacional.

 

De facto, em 1975, o Conselho da Europa aprovou a Carta Europeia do Património Arquitectónico. Neste documento definiu-se que “o património europeu é constituído, não só pelos nossos monumentos mais importantes, mas também pelos conjuntos de construções mais modestas das nossas cidades antigas e aldeias tradicionais inseridas nas suas envolventes naturais ou construídas pelo homem” (27).

 

A UNESCO aprovou no ano seguinte (1976), em Nairóbi, a Recomendação sobre a Salvaguarda dos Conjuntos Históricos e da sua Função na Vida Contemporânea. Neste documento declarava-se: “os conjuntos históricos e o seu enquadramento constituem um património universal insubstituível. A sua salvaguarda e integração na vida colectiva da nossa época devem constituir uma obrigação para os governos e para os cidadãos” (28).

Em Rio Maior, no entanto, num período anterior à entrada de Portugal para a então Comunidade Económica Europeia, privilegiava-se uma ideia diferente de progresso. Entre 1974 e 1985, a Câmara Municipal de Rio Maior promoveu a demolição do quarteirão onde se localizava o antigo Centro Escolar Republicano e do quarteirão formado pela Travessa do Açougue, Rua Tenente Comandos Oliveira Coimbra e Rua Mouzinho de Albuquerque, aprovou a construção do Cinema Casimiros, destruindo o panorama secular do adro da Capela de N.a S.a da Vitória,  aprovou também a construção da torre da Praça da República (figura 37), do edifício Regalo, na Rua do Jornal O Riomaiorense, ainda hoje parcialmente devoluto, da torre da Rua D Afonso Henriques (figura 38), da torre da Avenida João Afonso Calado da Maia, e ainda daquele que teria sido o edifício mais alto da Península Ibérica à data: uma torre de 30 andares na Avenida Paulo VI, que não seria construída.

 

Como desígnio para futuro, o Município propunha-se, em 1984, além da construção de um novo centro cívico na zona da Avenida Paulo VI, a construção de um novo mercado municipal e de uma nova estação rodoviária nos terrenos da Villa Romana e da Moagem Maria Celeste, que teriam sido irremediavelmente destruídas caso o Plano de Pormenor (figura 39) fosse concretizado.

 

 

 

 

 

(27)

Carta Europeia do Património Arquitectónico”. Conselho da Europa, Estrasburgo, 26 de Setembro de 1975, disponível na internet a 1 de Outubro de 2018.

(28)

Recomendação sobre a Salvaguarda dos Conjuntos Históricos e da sua Função na Vida Contemporânea”. UNESCO, Nairóbi, 26 de Novembro de 1976, disponível na internet a 1 de Outubro de 2018.

(continua na página seguinte)

Figura 39 - Plano de Pormenor da Zona do Mercado e Estação Rodoviária, a construir nos terrenos da Villa Romana e da Moagem Maria Celeste, Arquitecto Carlos Garcia, 1984. © Arquivo O Riomaiorense.

Plano de Pormenor da Zona do Mercado e Estação Rodoviária, a construir nos terrenos da Villa Romana e da Moagem Maria Celeste, Arquitecto Carlos Garcia, 1984. © Arquivo O Riomaiorense.
Edifício dissonante. Torre da Praça da República (1974-79). © António Moreira, 2018. Arquivo O Riomaiorense.

Figura 37 - Edifício dissonante. Torre da Praça da República (1974-79). © António Moreira, 2018. Arquivo O Riomaiorense.

Edifício dissonante. Torre da Rua D. Afonso Henriques (Anos 80). © António Moreira, 2018. Arquivo O Riomaiorense.

Figura 38 - Edifício dissonante. Torre da Rua D. Afonso Henriques (Anos 80). © António Moreira, 2018. Arquivo O Riomaiorense.

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