(Arquivo) Como nasceu a 2.a Série de O Riomaiorense (11)
Por António Custódio dos Santos
In O Riomaiorense (3.a Série) no. 280, de 28 de Março de 1964
A Estrada das Quebradas
Uma campanha ainda de natureza importante para a vida de todo o concelho e da própria comarca, foi levantada pelo denodado defensor de tudo quanto dizia respeito à nossa adorada terra. Era a construção duma Estrada que partindo da povoação de Quebradas, tivesse o seu terminus em Rio Maior.
Representava esta uma justíssima aspiração de todo o concelho, já há muitos anos reclamada, mas nem a monarquia nem a República, lhe haviam ligado a menor atenção. Construindo-se este meio de comunicação, a distância entre Rio Maior e a capital do país ficaria consideravelmente reduzida, motivo pelo qual ninguém havia que deixasse de ligar a tão magno assunto, o maior e o mais entusiástico de todos os interesses.
O Riomaiorense, pois, enfrenta mais este importante problema, dedicando-se a ele com o denodo, a virilidade e o carinho que tinha emprestado a todas as outras anteriores campanhas.
A tarefa, aliás, era agora um tanto mais fácil, porquanto, no Parlamento já se encontravam além do dedicadíssimo Francisco José Pereira, António Gomes de Sousa Varela, Senador, e seu dinâmico filho doutor José Gomes de Carvalho Sousa Varela, deputado. Havia sido eleito ainda, pelo círculo de Santarém, António Augusto Tavares Ferreira, director do Jornal O Debate, que gozava em Rio Maior de gerais simpatias, nunca se tendo recusado a atender-nos quando dele nos aproximávamos solicitando o seu concurso para qualquer assunto que interessasse à nossa tão esquecida como generosa Terra.
Efectivamente, com todos estes bons elementos nos encontrámos sempre, combinando planos, acertando rumos, até que se conseguiu que fosse posta a concurso a construção da almejada Estrada!
Encerrado o concurso o respectivo arrematante procedeu imediatamente à terraplanagem, chegando esta até quase à entrada da vila, um pouco por detrás do cemitério.
Mas a maldita grande Guerra atrapalhava todos os planos, por melhor calculados que eles fossem!
Concluída a terraplanagem não apareceu ninguém que se dispusesse a arcar com as responsabilidades da continuação dos trabalhos em vista da galopante ascenção diária não somente dos salários, como de tudo o mais que era necessário para aquela tão simpática obra!
O Governo, por sua vez, a braços com a nossa forçada intervenção no tremendo conflito, não podia, nem um momento sequer, desviar a sua atenção de tão pavorosa tragédia e a decantada estrada ficou para os riomaiorenses, na alviçareira terraplanagem, como a linha férrea Vendas Novas – Peniche, havia parado, engasgada, na estação do Setil!...
A saída de Ernesto Alves
Um caso bastante doloroso e sem dúvida grave para a existência do Jornal, ia colocar em sério alvoroço o coração de António Custódio.
Foi a circunstância, inesperada, de haver sido oferecido a Ernesto Alves, sem favor uma águia encerrada, por humano erro de visão, nos estreitos limites duma gaiola, um lugar de Chefe de Secção numa repartição ministerial, em Lisboa, e ele, dando sobre isto explicações ao seu amigo, bate aprazivelmente as asas, estoura com as grades da gaiola e voa, triunfante, para a cidade de mármore e granito!
O Riomaiorense perde, assim, o seu melhor colaborador; um elemento que ninguém mais poderá substituir, e isto, forçoso se torna confessá-lo, arrasa moralmente António Custódio!
Com a sua grande energia, porém, e uma indómita força de vontade, passada a surpresa dos primeiros dias, procura reagir, conseguindo, finalmente, recuperar o ânimo momentaneamente abalado.
E o Jornal permanece no seu posto, sem dar parte de fraco, sem mostrar a quem quer que seja, a séria lacuna que o Destino, incompreensível, acaba de fazer desabar sobre a sua contextura!
Mas a Grande Guerra que enlutou a França e o Mundo, e cujo armistício foi assinado em 11 de Novembro de 1918, com a derrota fragorosa dos arrogantes exércitos do Kaiser, continua espalhando os seus terríveis efeitos, particularmente, por toda esta nossa adorável Nação portuguesa.
Ninguém escapa às suas calamitosas consequências. O papel de imprensa sobe todos os dias de maneira assustadora, bem como a tinta de impressão e todo o material necessário à feitura dum jornal.
O Dias Ferreira vê-se aflito para poder manter o compromisso assumido, e António Custódio, compreendendo a situação, combina com ele um reajustamento.
Poucos meses decorridos, porém, esse reajustamento já se considera obsoleto! Resolvem, então, a saída do Jornal, para não deixar de ser semanal, apenas com uma folha, isto é, duas páginas em vez de quatro, como até ali.
Isto, entretanto, desgosta profundamente António Custódio, que decide, como último recurso, suspender temporariamente o querido O Riomaiorense, até que a Roda dos Ventos mude e nova oportunidade possa surgir.
Mas essa oportunidade nunca surgiu!
António Custódio, por um cataclismo que arrasou totalmente a sua vida, vê-se forçado a retirar para o estrangeiro, abandonando a família que idolatrava, perdendo haveres, dilacerando a reputação, tornado-se alvo, enfim, do vilipêndio e do ultrage de quantos apareceram, no momento, a declarar-se seus inimigos figadais!...
Surge, porém, Armando Pulquério, vários anos volvidos, e com um grupo de bons amigos, resolve ir arrancar ao mundo dos objectos perdidos, o abandonado O Riomaiorense, fazendo-o voltar à luz da publicidade e dando-lhe com o fulgor do seu talento, da sua energia e da sua mocidade, aquela flama e aquela firmeza de atitude, que sempre o haviam animado durante a sua buliçosa existência!
Bem haja Armando Pulquério; e dentro da modicidade dos meus recursos, aqui me tem, para quanto lhe possa ser útil, à sua incondicional disposição.
Niteroi. Capital do Estado do Rio de Janeiro. Maio de 1963.
António C. Santos