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(Arquivo) Como nasceu a 2.a Série de O Riomaiorense (6)

Por António Custódio dos Santos

In O Riomaiorense (3.a Série) no. 273, de 10 de Janeiro de 1964

 

 

 

 

E a grande comissão, da qual faziam parte Sousa Varela e António Custódio, voltou para as suas terras com a mesma acabrunhante dúvida, interrogando-se a si própria: O que haverá afinal em volta desta já lendária linha férrea? Serão sinceras e honestas todas as esperançosas palavras que ouvimos?

 

Varela e Custódio, aproveitando a ocasião de se acharem na frente do Ministro, abordaram, uma vez mais, o também magno assunto da linha telegráfica. Aqui, o probo Estadista foi mais peremptório: Afirmou que já mandara proceder ao indispensável estudo da linha e que não queria sair do Ministério sem deixar essa obra de tanta relevância, não somente para Rio Maior como para todo o país, absolutamente concretizada.

 

Efectivamente, poucos dias depois, sabia-se que um grupo de Engenheiros havia chegado a Santarém com material necessário, e começara os estudos da almejada e já quase lendária linha telegráfica, com passagem pela Vila da Marmeleira, onde seria colocada uma estação, conforme os justos anseios daquele bom e democrático povo!

 

Os estudos demoraram mais do que a nossa perseverante paciência poderia desejar. Contudo, terminados eles dava-se inicio à construção do que representava para Rio Maior uma das suas mais prementes e mais justas aspirações! Alguns poucos meses volvidos, a linha chegava ao seu término e os esforçados e queridos riomaiorenses já podiam falar directamente com a capital do seu distrito! Tanto em Rio Maior, como em Santarém, esse dia foi de plena festa. Trocaram-se telegramas de saudação entre as autoridades respectivas. As duas Câmaras e o próprio Governo Civil hastearam os seus estandartes em sinal de regozijo.

 

Enfim, estava terminada gloriosamente uma campanha encetada por O Riomaiorense, com o apoio incondicional – deve dizer-se – não somente das autoridades e do povo de todo o concelho, mas ainda das próprias autoridades de Santarém e dos nossos dignos e esforçados representantes no Parlamento, para os quais foram, nesse histórico dia, enviados telegramas de saudação e agradecimento, assim como para o digno Ministro do Fomento.

 

Primeira vitória, pois, do nosso jornal!

 

A segunda viria com a transferência de duas freguesias, Alguber e Figueiros, da comarca de Alenquer para a nossa comarca.

 

Os habitantes daquelas freguesias eram os próprios a reclamar a transferência para Rio Maior, por lhes ficar muito mais próximo do que Alenquer, mas os influentes políticos desta populosa comarca, faziam pressão para que tal transferência se não efectivasse. Era necessário, pois, da parte de Rio Maior, diplomacia e habilidade. Mais do que campanhas na imprensa, urgia que se fizesse trabalho de gabinete e assim se procedeu.

 

Amarino Calisto, homem habilidoso, diplomata astuto, inteligente, foi o escolhido pela redacção de O Riomaiorense para ir a Alguber e Figueiros convencer os presidentes das Juntas de Freguesia a arranjar cada um, na área da sua jurisdição, um abaixo assinado, com o maior número de assinaturas possível e dentro do segredo máximo que se pudesse obter, dirigido ao Ministro da Justiça, afim de facilitar mais a consecução das legítimas aspirações de todos.

 

Não podia ser coroada de melhor êxito a delicada missão do nosso distinto e esforçado colega. Menos de oito dias volvidos, os dignos presidentes das Juntas de Freguesia de Alguber e Figueiros, procuraram-nos com os dois abaixo assinados repletos de assinaturas. Foi marcada logo uma reunião desses dois dignos representantes das citadas freguesias no Ministério da Justiça, e no dia e hora marcados, lá estavamos todos. De Rio Maior foram Sousa Varela, Eugénio Casimiro e António Custódio, os quais combinando previamente com o dedicado e eficiente deputado pelo círculo, Francisco José Pereira, este não deixou, igualmente de comparecer, fazendo as indispensáveis apresentações ao Ministro da Justiça.

 

Compreendemos bem, nesta altura, que o ilustre titular da pasta estava tocado por forças contrárias, porque mostrando-se impressionado com os abaixo assinados, e com tudo quanto se lhe expunha, sacudiu para cima do Secretário Geral do Ministério, doutor Germano Martins. Explicava que tratando-se de um assunto de natureza jurídica, indispensável era que o representante da Lei sobre ele se manifestasse.

 

Francisco José Pereira, homem de uma só fé, amigo lealíssimo de todos, muito experimentado nas artimanhas políticas, mostrou-se em absoluto concordante com os melindres do Ministro, mas perguntou-lhe, todavia, se ele tinha alguma objecção a fazer, no caso de a Comissão desejar cumprimentar o doutor Germano Martins, e expôr-lhe também, pessoalmente, o assunto que o levara a Lisboa.

 

Engasgou um pouco Sua Excelência; teve uma tossezinha como que para meditar na resposta e finalmente decidiu: Não. Absolutamente. Sinto até com isso muito prazer!

 

Despediu-se em seguida a Comissão, agradeceu a maneira cavalheiresca como havia sido recebida e saiu dali para o gabinete do eficiente e sempre justiceiro Secretário Geral do Ministério. Este, amigo de longa data de quase todos, criatura simpática e amável por temperamento, levantou-se da sua cadeira logo que nos viu entrar e abraçando todos um por um, perguntou com o seu jovial e habitual sorriso: Então a que devo a honra de tão distintos visitantes?

 

Francisco José Pereira, fazendo-lhe a apresentação especial dos dignos representantes de Alguber e Figueiros, resumiu em palavras, tanto quanto possível sucintas, a aspiração dos povos daquelas duas populosas freguesias: Que se encontravam amarrados a uma comarca imensamente distante dos seus domicílios, desejando passar para Rio Maior por lhes ficar, sensivelmente, a metade do caminho!

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Explicou ainda que os dois simpáticos representantes daquelas freguesias tinham vindo munidos de dois abaixo assinados, com grande número de assinaturas, os quais haviam ficado em poder do Excelentíssimo Ministro, que nada querendo resolver, desculpara-se que ía ouvir a opinião do doutor Germano Martins, Secretário Geral do Ministério e de harmonia com o parecer escrito que ele expendesse assim procederia.

 

Quase sem deixar terminar a clara exposição do eminente deputado, o impecável doutor Germano Martins, firme, peremptório, sentenciou: Mas isso é um caso que não admite sequer consultas! É uma desumanidade obrigar qualquer povo, tantas vezes por casos de mínima importância, a caminhar para uma comarca longínqua, quando o pode fazer para outra, como no caso presente, que fique a metade da distância!

 

Quando essa consulta chegar às minhas mãos, movam-se as influências que se moverem, fiquem certos de que imediatamente, sem segredos nem subtilezas, eu me pronunciarei de harmonia com os ditames da minha consciência e com a justiça plena, soberana que o caso requer! E estendendo, uma vez mais,  a sua mão honrada para todos, com a singeleza e a sinceridade que eram as suas principais características: Ide para vossas casas tranquilos. Dentro de breves dias – asseguro-vos – a vossa justíssima aspiração será concretizada.

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